O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) deve decidir, nos próximos dias, a maior controvérsia do País envolvendo o sistema cartorário e o fim dos cartórios hereditários no país. nepotismo nessa área. Trata-se do processo sob relatoria do desembargador João Luiz de Sousa – já pronto para decisão da Corte Especial do TRF-1 – sobre o cartório do 1º Tabelionato de Protesto Oficial e de Registros de Títulos e Documento Civil de Pessoa Jurídica de Goiânia (GO).
Seu ex-titular Maurício Borges Sampaio (era herdeiro e a Constituição de 1988 determinou que só concursados podem assumir a função) trava na Justiça, desde 2008 – quando foi oficialmente afastado pela primeira vez – uma batalha persistente, nem sempre com as armas mais legítimas. O cartório foi, por exemplo, o pivô da decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de aposentar compulsoriamente o juiz goiano Ari Ferreira de Queiroz, acusado de beneficiar Sampaio com diversos processos judiciais, todos questionados perante o TRF-1, inclusive um que manda reintegrá-lo à função cartorária.
Cumprindo a decisão do CNJ que determinara o afastamento de todos os oficiais e substitutos em cartórios por razões hereditárias, o chamado nepotismo, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) editou em 2008 o Decreto 525 referendando aquele ato e obrigando ao de todos os agentes de cartórios que não fossem concursados, como passou a definir a Constituição de 1988. O então responsável pelo lº Protesto de Goiânia, Maurício Sampaio, recorreu da decisão ao próprio Tribunal de Justiça, que negou sua petição observando que apenas fazia cumprir ordem o CNJ – o órgão de controle externo do Poder Judiciário.
Maurício Sampaio ingressou então com ação anulatória perante o perante o juiz Ari Ferreira de Queiroz, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Goiás, a quem já havia recorrido antes de o TJ afastá-lo. O juiz deu ganho de causa a Sampaio e mandou anular seu afastamento. Por atropelar a hierarquia judicial e passar por cima de resolução do CNJ, que regula todo o Poder Judiciário, a decisão do juiz Ari de Queiroz foi questionada perante o TRF-1 pela Advocacia Geral da União (AGU), e reforçada pelo atual titular do Cartório, Nurican Lacerda. Eles pedem a anulação do ato de Queiroz que beneficiou Sampaio, observando que além de ilegal e inconstitucional, ela contraria toda a jurisprudência brasileira sobre a matéria.
Aposentado compulsoriamente há um ano pelo CNJ, em decisão que teve como relatora a ministra Maria Cristina Peduzzi, o juiz Ari de Queiroz foi acusado por desvios de funções tipificadas na Lei Orgânica da Magistratura (Loman), a LC 135. Em Goiânia, ficou conhecido por seus atos abertamente favoráveis a Maurício Sampaio, ao ponto de levar o c tabelionato ao ranking de cartório mais rentável do Brasil, segundo a associação de classe. Numa de suas decisões, o juiz obrigou o Estado de Goiás a registrar seus contratos de financiamento de veículos no cartório de Sampaio; em outra, concedeu liminar para que o oficial cobrasse pelo registro de imóveis valores bem superiores aos estipulados pela legislação.
Além de tabelião interino, Maurício Sampaio é conhecido cartola em Goiânia, atual presidente do Atlético Goianiense e amigo íntimo do contraventor Carlinhos Cachoeira e do ex-senador Demóstenes Torres, cassado em razão de seu envolvimento com Cachoeira, a quem chegou a beneficiar com ações no Congresso Nacional. Em 2013 chegou a ser preso preventivamente em Aparecida de Goiânia, denunciado como mandante do assassinato do jornalista, radialista e cronista esportivo Valério Luiz, em 2012, supostamente por sua atuação contra o Atlético-GO.
Desde que foi afastado do cartório em 2008, Sampaio moveu diversos processos no TJGO, no CNJ e no Supremo Tribunal Federal (STF), mas perdeu todos, tentando reaver sua função. Em janeiro desde ano, pela via do mandado de segurança, ele obteve liminar com o ministro Ricardo Lewandowski para retornar ao cartório. Mas a decisão não pode ser cumprida uma vez que ele fora afastado também por ação de improbidade administrativa. O juiz relator do caso já havia negado a liminar desde 2013, mas Sampaio alegou depressão e solicitou a medida novamente, durante período de plantão de Lewandowski. Uma semana depois de concedida a liminar, a mesma foi cassada pela ministra Cármen Lúcia, que substituíra Lewandowski.
Em fevereiro desde ano, o ministro Teori Zavascki extinguiu os dois últimos processos de Maurício Sampaio no STF – os mandados de segurança 32.104 e 32.862, afirmando que os pedidos eram meras repetições de ações anteriores. Agora, na iminência de ser julgada a ação rescisória que contra ele a AGU e Nurican Lacerda movem no TRF-1, Sampaio pode estar chegando ao fim da linha em sua saga de persistentes – e quase sempre ilegítimos – apelos para se manter no cartório mesmo não sendo concursado.
No último dia 17, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal negou os dois últimos recursos do cartola goiano, acusado de homicídio do jornalista Valério Luiz em 2012, Maurício Borges Sampaio, na tentativa de voltar ao 1º Protesto de Goiânia, cartório que já se encontra ocupado por um concursado.