O presidente Figueiredo tornou-se em 1983 o primeiro chefe de Estado brasileiro a realizar uma visita oficial ao continente africano. A comitiva presidencial passou por cinco países da África: Nigéria, Senegal, Argélia, Cabo Verde e Guiné Bissau – sempre precedida de um grupo de jornalistas credenciados na Presidência da República.
Tudo transcorria tranquilo até a recepção, à noite, no palácio do governo da Guiné-Bissau. Garçons servindo salgadinhos e bebidas. O uísque rolava solto. Comitiva, imprensa, autoridades e convidados africanas circulavam pelo salão onde ocorria o evento.
Em certo momento o presidente da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira, conversava com o presidente Figueiredo numa descontração total.
Figueiredo falava do Brasil, da diversidade cultural, da miscigenação de seu povo etc.
Nisso, passa por perto deles o repórter-cinematográfico de uma empresa de Cine Tv Produções. Um cinegrafista negro, credenciado no Planalto, e que integrava a comitiva de imprensa brasileira.
Figueiredo chama-o e o apresenta a João Bernardo Vieira.
Foi aí que Figueiredo se lascou. Apresentado ao presidente africano e o único negro da comitiva, o cinegrafista que já tinha mamado uns cinco uísques, se sentiu a última Coca-Cola do deserto. Orgulhoso, vendo os coleguinhas espantados e curiosos com ele conversando animadamente entre os dois mandatários, se encheu todo.
Com os olhos vermelhos, já falando um pouco arrastado e não dispensando um copo de uísque de qualquer garçom que passasse por perto, ele tomou logo intimidades.
Com uma mão no ombro de Figueiredo e chegando até a dar um tapinha na barriga de Vieira quando este lhe disse alguma coisa e Figueiredo caiu na gargalhada, o cinegrafista estava mais feliz que pinto no lixo.
Chegou a causar até um certo reboliço entre a imprensa africana que correu para lá batendo fotos e filmando para saber quem era aquele integrante da comitiva brasileira tão loquaz entre os dois presidentes.
Uísque na mão e já meio na manguaça, ele começou a agitar o pessoal do Cerimonial do Itamaraty. O chanceler Saraiva Guerreiro se aproximou para, diplomaticamente, tentar tirá-lo dali. Quem disse? Ele, com a corda solta e agarrado no braço de Figueiredo, era o dono da festa.
Passada a visita, no dia seguinte, já no avião comercial de volta para o Brasil, o repórter que chefiava a equipe da produtora cobrou dele o comportamento na noite anterior. Foi a conta. O cinegrafista- que já tinha tomado a bordo uns quatro ou cinco uísques – não gostou e a bordo mesmo meteu a porrada no chefe.
E justificou:
“Não admito que me cobrem postura quando eu apenas interlocutava com amigos”.
E mais não disse. (Emerson Souza)