Direito Global
blog

A Constituição de 1988

O artigo ” A Constituição de 1988 ” é de autoria de Ricardo Baitello, advogado, jornalista profissional, e cobriu a Assembléia Nacional Constituinte de 1988 como repórter do Jornal O Estado de S. Paulo

“Trinta e dois anos se passaram desde que o Congresso Brasileiro colocou em vigor a nova Constituição do país, em 05 de outubro de 1988.
Essa história, contada e recontada inúmeras vezes, tem sempre algo de novo a ser acrescentado. Afinal é sétima ou a oitava ( ? ) constituição desde que o Brasil se tornou uma nação independente, em 07 de setembro de 1822, se for considerado que a emenda no 1 de 1969, decretada pela junta militar, criou uma nova constituição.
A primeira Constituição, a única do império, foi outorgada em 24 de Março de 1824 por Dom Pedro I, após a dissolução da Assembleia Constituinte de 1823. Durou sessenta e sete anos.
A segunda Constituição, a primeira da República, foi decretada e promulgada pelo Congresso Constituinte de 1891, convocado pelo governo provisório da República recém-proclamada. Teve por principais fontes de influência as Constituições dos Estados Unidos. Institucionalizava o Estado brasileiro como República Federal (Federalismo), sob governo presidencial. Estabeleceu o sufrágio universal masculino para todos os brasileiros alfabetizados maiores de 21 anos de idade, com voto a descoberto. O voto era aberto, excluindo ainda analfabetos, mulheres e militares. Durou quarenta e três anos.
A terceira Constituição foi promulgada em 1934. Desde a Revolução de 1930, Getúlio Vargas, na qualidade de Chefe do Governo Provisório, governava o país por decreto. Só em 1933, após a derrota da Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo, é que foi eleita a Assembleia Constituinte que redigiu a constituição do Governo Constitucional da Era Vargas. Suas principais fontes foram a Constituição alemã de Weimar e a Constituição republicana da Espanha de 1931. Tinha como principais inovações a introdução do voto secreto e o sufrágio feminino, a criação da Justiça do Trabalho, definição dos direitos constitucionais do trabalhador (jornada de 8 horas diárias, repouso semanal e férias remuneradas). Durou apenas três anos.
A quarta, Constituição do Estado Novo foi outorgada pelo presidente Getúlio Vargas em 10 de Novembro de 1937, mesmo dia em que implanta a ditadura do Estado Novo. Ocorreu centralização de poder na figura de Getúlio Vargas. Também conhecida como a Constituição Polaca, por ter sido baseada na Constituição autoritária da Polônia. Durou quase doze anos.
A quinta, Constituição de 1946, foi promulgada em 18 de setembro de 1946. A mesa da Assembleia Constituinte promulgou Constituição da República Federativa do Brasil e o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias no dia 18 de setembro de 1946, consagrando as liberdades expressas na Constituição de 1934, que haviam sido retiradas em 1937. Durou vinte e uma anos.
A sexta, Constituição foi semioutorgada. Foi elaborada pelo Congresso Nacional, a que o Ato Institucional n. 4 atribuiu função de poder constituinte originário (“inicial, ilimitado, incondicionado e soberano”). O Congresso Nacional, transformado em Assembleia Nacional Constituinte e já com os membros da oposição afastados, elaborou sob pressão dos militares uma Carta Constitucional que legalizasse os governos militares (1964-1985).
A Constituição de 1967 recebeu em 1969 nova redação por uma emenda decretada pelos “Ministros militares no exercício da Presidência da República”. É considerada por alguns especialistas, em que pode ser formalmente uma emenda à constituição de 1967, uma nova Constituição de caráter outorgado. Porém outros não a consideram uma nova constituição no sentido literal do termo.
A Constituição de 1967 foi alterada substancialmente pela Emenda No 1, baixada pela Junta Militar que assumiu o governo com a doença de Costa e Silva, em 1969. Esta intensificou a concentração de poder no Executivo dominado pelo Exército e, junto com o AI-12, permitiu a substituição do presidente por uma Junta Militar, impedindo a posse do vice-presidente Pedro Aleixo, um civil.
Além dessas modificações, o governo também decretou uma Lei de Segurança Nacional, que restringia severamente as liberdades civis (como parte do combate à subversão) e uma Lei de Imprensa, que estabeleceu a Censura Federal que durou até o governo José Sarney.
O Ato Institucional Número Cinco deu poderes ao presidente para fechar, por tempo indeterminado, o Congresso Nacional, as Assembleias Estaduais e as Câmaras Municipais, para suspender os direitos políticos por 10 anos e caçar mandatos efetivos e ainda decretar ou prorrogar estado de sítio. Foi instituída no mandato do Marechal Arthur Costa e Silva. Pode não ser considerada uma Constituição por ter sido outorgada
pelos três ministros militares sob a aparência de emenda constitucional durante o recesso forçado do Congresso Nacional.
Mas, voltando a 1988, a Constituição, decretada e promulgada pela Assembleia Nacional Constituinte, em 05 de outubro, deu forma ao regime político vigente. Manteve o governo presidencial, garantindo que fossem eleitos pelo povo, por voto direto e secreto, o Presidente da República, os Governadores dos Estados, os Prefeitos Municipais e os representantes do poder legislativo, bem como a independência e harmonia dos poderes constituídos. Ampliou os direitos sociais e as atribuições do poder público, alterou a divisão administrativa do país que passou a ter 26 estados federados e um distrito federal. Instituiu uma ordem econômica tendo por base a função social da propriedade e a liberdade de iniciativa, limitada pelo intervencionismo estatal.
Quando a cerimônia foi encerrada, pouco depois das 17h, o país havia concluído a transição entre a ditadura e a democracia e começava a viver um novo período histórico.
Vale lembrar que no dia 5 de outubro o país viveu uma situação inusitada: até as 15h50 daquele dia, o Estado e a sociedade foram regidos por uma constituição e, daquele momento em diante, por outra. Assim, os pais brasileiros, por exemplo, passaram a ter direito à licença-paternidade, algo que não havia antes, e a polícia não pôde mais realizar operações de busca e apreensão sem autorização judicial.
O dia 5 de outubro amanheceu chuvoso depois de quatro meses de estiagem na capital do país. A chuva atrapalhou as celebrações preparadas para comemorar a promulgação e acabou desestimulando a participação popular nos eventos. O culto ecumênico concelebrado pelo cardeal arcebispo de Brasília na época, dom José Freire Falcão e pelo pastor Geziel Gomes, da Assembléia de Deus, marcado para as 9h da manhã, ocorreu no Salão Negro do Congresso e não no gramado da Esplanada dos Ministérios, como estava previsto.
À tarde, o presidente da Assembléia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, o da República, José Sarney, e o do Supremo Tribunal Federal (STF), Rafael Mayer, encontraram-se na rampa do Congresso e passaram em revista as tropas, sendo saudados por uma salva de tiros de canhão.
A sessão de promulgação começou pouco depois das 15h30, no Plenário da Câmara dos Deputados – a essa altura, lotado. Estavam presentes os constituintes, parlamentares
estrangeiros, embaixadores, integrantes do governo, militares, representantes de instituições religiosas e outros convidados. Logo depois da execução do Hino Nacional, Ulysses assinou os exemplares originais da Constituição, usando caneta que lhe havia sido presenteada por funcionários da Câmara em 1987.
Em seguida, Ulysses levantou-se de sua cadeira e ergueu um exemplar.
– Declaro promulgada. O documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça social do Brasil. Que Deus nos ajude para que isso se cumpra!
Todo o Plenário aplaudiu. Eram 15h50 – a partir desse momento, passava a valer a nova Constituição do Brasil.
Depois disso todos os constituintes – que agora passavam a exercer apenas as funções de congressistas -, além do presidente da República e do STF, juraram “manter, defender, cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil”. Muito emocionado, o então presidente José Sarney tinha a mão trêmula ao pronunciar seu juramento.
Nessa sessão histórica, houve apenas três discursos. O primeiro, do senador Afonso Arinos, presidente da Comissão de Sistematização. Antes da instalação da Constituinte, Afonso Arinos havia liderado uma comissão de notáveis que foi designado por Sarney para apresentar um anteprojeto para a nova Constituição – que acabou não sendo formalmente encaminhado ao Congresso.
– Senhores constituintes, concluída esta vossa tarefa preferencial, mas outro dever se abre ao vosso cuidado e esforço. Este dever indeclinável é sustentar a Constituição de 1988, apesar de quaisquer divergências com sua feitura; é colaborar nas leis que a tornem mais rapidamente o mais eficazmente operativa, apesar das dificuldades referidas.
A sessão foi encerrada com o discurso do deputado Ulysses Guimarães, que se tornou um dos principais símbolos da Constituinte, sempre defendendo seus trabalhos contra os críticos e procurando contornar os impasses surgidos. Em seu discurso, dr. Ulysses, como era chamado, sintetizou aquele que, a seu ver, era a principal contribuição do novo texto constitucional:
– Hoje, 5 de outubro de 1988, no que tange à Constituição, a Nação mudou. A Constituição mudou na sua elaboração, mudou na definição dos poderes, mudou restaurando a Federação, mudou quando quer mudar o homem em cidadão, e só é cidadão quem ganha justo e suficiente salário, lê e escreve, mora, tem hospital e remédio, lazer quando descansa.
Mas esta história merece ser contada desde o seu início, com a instalação da Assembleia Nacional Constituinte, em 1o de fevereiro de 1987, um domingo. Poderia ser um dia como outro qualquer. Mas em 1o. de fevereiro de 1987, às 16 horas, um homem entrou para a História como o único brasileiro a presidir os três Poderes da República: José Carlos Moreira Alves, presidente do Supremo Tribunal Federal, que, além de chefiar o Judiciário e ter substituído por uma vez o presidente Sarney, presidiu a solenidade de instalação da Assembleia Nacional Constituinte.
Moreira Alves, contudo, encarou a função com tranquilidade, Para ele foi apenas o cumprimento da lei. Com toda essa tranquilidade, ele não alterou sua rotina. Por volta das 15 horas deixou seu apartamento no Bloco B da SQS 113, onde morava a maioria dos Ministros do Supremo, na ocasião, e se dirigiu ao Congresso Nacional onde passou em Revista as Tropas do Exército, postadas ali para a abertura da solenidade.
A Assembleia Nacional Constituinte de 1987, também referida como Assembleia Nacional Constituinte de 1988 ou como Assembleia Nacional Constituinte de 1987- 1988 foi instalada no Congresso Nacional, em Brasília, a 1o de fevereiro de 1987, resultante da Emenda Constitucional no 26, de 1985 com a finalidade de elaborar uma Constituição democrática para o Brasil, após 21 anos sob regime militar. Sua convocação foi resultado do compromisso firmado durante a campanha presidencial de Tancredo Neves (1910-1985), primeiro presidente civil eleito, pelo voto indireto, após a ditadura. O presidente, entretanto, morreu antes de assumir o cargo. Ficou nas mãos de José Sarney assumir o Palácio do Planalto e instalar a Assembleia. Os trabalhos da Constituinte foram encerrados em 22 de setembro de 1988, após a votação e aprovação do texto final da nova Constituição brasileira.
Mas, apesar de todos os avanços e conquistas, ficaram para trás ideias e projetos brilhantes, não aprovados e não entraram no texto constitucional. Entre estas proposta fica o relatório e o anteprojeto do Judiciário e Ministério Público elaborado pelo Plinio de Arruda Sampaio, na Constituinte, uma joia rara.
O tema, hoje, é bem oportuno e hora de se pensar em mudanças que possam dinamizar o judiciário brasileiro.
O projeto de Plinio cria um tribunal constitucional com nove ministros, mandato de doze anos sem recondução e renovação de quatro em quatro anos. Cria também um Superior Tribunal de Justiça, nos mesmos moldes, com quinze ministros, sendo cinco oriundos da magistratura, cinco do Ministério Público e cinco advogados.
Criava também tribunais e juízes agrários.
Vale salientar que o deputado paulista do antigo MDB, falecido em 2014, foi um advogado, intelectual e ativista político brasileiro. Filiado ao Partido Socialismo e Liberdade foi candidato à Presidência da República do Brasil nas eleições de 2010, obtendo a quarta posição, com 886.816 votos. Quando esteve exilado no Chile foi ele quem elaborou o projeto social do Governo Salvador Allende.
Do Tribunal Constitucional
Art. 13 – O Tribunal Constitucional é composto de nove Ministros: três escolhidos pelo Presidente da República, três escolhidos pelo Congresso Nacional e três escolhidos pelo
Tribunal Superior Justiça
I- Os Ministros do Tribunal serão escolhidos entre bacharéis em direito de notório saber jurídico, com pelo menos vinte anos de exercício profissional
II- O mandato dos Ministros será de doze anos vedada a recondução renovando- se o Tribunal por um terço a cada quatro anos
III- Durante o exercício do mandato, os ministros gozarão das garantias e sujeitar-se-ão das vedações próprias da magistratura, perdendo o cargo somente por condenação em crime comum ou de responsabilidade e fazendo jus a vencimentos fixados a Ministros de Estado.
IV- Findo o mandato, o Ministro fará juz a aposentadoria correspondente aos vencimentos do cargo, vedadas quaisquer acumulações.”