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A agressão sofrida por Pedro no seu contrato de trabalho

O artigo A agressão sofrida por Pedro no seu contrato de trabalho é de autoria do advogado Sérgio Batalha Mendes (OAB/RJ nº 62.857):

No último sábado à noite, nos minutos finais do jogo do Flamengo contra o Atletico Mineiro, o jogador Pedro não acata a determinação do preparador físico Pablo e se recusa a iniciar um aquecimento com os demais jogadores à beira do gramado. Encerrada a partida, inicia-se uma discussão entre o jogador e o preparador físico que, ao final, desfere um soco na boca de Pedro.

O jogador agredido dirige-se à Delegacia Policial, registra a ocorrência, acompanhado de três outros jogadores como testemunhas. É realizado um exame médico, que constata a lesão corporal de natureza leve. Incontroversa a agressão, a questão remanescente é qual o seu efeito sobre o contrato de trabalho do atleta agredido?

Antes de prosseguir é importante ressaltar que o contrato de trabalho do atleta profissional de futebol é regulado pela Lei nº 9.615/1998 (Lei Pelé) e pela própria CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), constituindo-se em contrato de trabalho por prazo determinado, como estipulado pelo artigo 30 da Lei nº 9.615/98.

Assim, o jogador profissional de futebol é empregado da associação esportiva pela qual disputa as partidas e torneios, aplicando-se a ele muitas das normas trabalhistas que regem os demais trabalhadores com carteira assinada, com as especificidades determinadas pela Lei Pelé.

Um aspecto da legislação que rege o contrato de trabalho de atletas profissionais de futebol extremamente relevante no caso da agressão do jogador Pedro é a coincidência do vínculo esportivo com o trabalhista, ensejando a possibilidade do atleta se transferir para outra agremiação na hipótese de rescisão indireta do contrato de trabalho, como previsto no inciso IV, do parágrafo 5º do artigo 28 da Lei 9.615/98.

A rescisão indireta do contrato de trabalho é a modalidade de rescisão por justa causa do contrato de trabalho que pode ser requerida na Justiça do Trabalho pelo empregado face ao seu empregador, nas hipóteses de ocorrência de faltas graves como as tipificadas no artigo 483 da CLT.

No caso do atleta Pedro, a agressão sofrida pode ser enquadrada na alínea “f” do artigo 483 da CLT, in verbis: “O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: (…) f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem”.

A rescisão indireta implica no pagamento das verbas rescisórias como se tivesse ocorrido uma rescisão sem justa causa, o que no caso do atleta profissional de futebol significa que ele não apenas pode se transferir para outro clube sem o pagamento da multa rescisória, como ainda pode receber uma indenização compensatória pela rescisão antecipada do contrato por culpa do empregador, prevista no inciso II do artigo 28 da Lei nº 9.615/1998.

Portanto, no caso do atleta Pedro a agressão perpetrada pelo preparador físico do Flamengo poderá ter como consequência um prejuízo milionário para o clube, privando-o não apenas da negociação dos chamados “direitos econômicos” do contrato (na verdade, a multa rescisória), como também no pagamento de uma indenização ao atleta pela rescisão antecipada, que terá de ser declarada pela Justiça do Trabalho.

O episódio envolvendo a agressão ao atleta Pedro revelou as graves consequências de uma rescisão indireta no caso de atletas de alto desempenho, com multas rescisórias milionárias em seus contratos, capazes de acarretar prejuízos igualmente milionários como consequência de um ato impensado praticado por dirigente ou membro da comissão técnica da associação desportiva.