A abolição da escravatura no Brasil aconteceu há 135 anos, no dia 13 de maio de 1888, por meio da Lei Áurea e ratificou a extinção do trabalho escravo dos negros em nosso país. A abolição da escravatura foi o resultado de um processo de luta popular, que contou com a adesão de parcelas consideráveis da sociedade brasileira, além de ter sido marcada pela resistência dos escravos. O Brasil foi o último país das Américas a abolir com a escravidão. Em 1888, a princesa Isabel, regente em nome do imperador, abriu os trabalhos legislativos com um apelo aos políticos pela libertação dos escravos. A Lei Áurea foi assinada pela Princesa Isabel, filha de Dom Pedro II. Assim, acabava oficialmente a escravidão e o mercado escravagista que vigorava no império desde 1535, quando o primeiro navio com negros escravizados chegou ao porto de Salvador.
As ruas ficaram marcadas por festas populares, como relembra Machado de Assis no artigo de 14 de maio de 1893 para o jornal Gazeta de Notícias: “Houve sol, e grande sol, naquele domingo de 1888, em que o Senado votou a lei, que a regente sancionou, e todos saímos à rua. (…) todos respiravam felicidade, tudo era delírio. Verdadeiramente, foi o único dia de delírio público que me lembra ter visto.”
A abolição do trabalho escravo do Brasil foi o resultado final de um processo longo, lento e difícil de muitas lutas. O fim do uso da mão de obra escrava em nosso país não foi resultado do humanismo ou da benevolência da família real brasileira, conforme muitos acreditam, mas aconteceu porque um grande número de pessoas de nossa sociedade mobilizou-se para forçar o Império a pôr fim ao trabalho escravo. A abolição da escravatura no Brasil aconteceu por meio da: Resistência realizada pelos próprios escravos ao longo do século XIX; Adesão de parte da nossa sociedade à causa por meio de associações abolicionistas; Mobilização política dos defensores do abolicionismo.
Além disso, havia a questão dos novos padrões civilizacionais que estavam surgindo e que condenavam a prática do trabalho escravo. Isso colocava o Brasil numa posição vexatória, internacionalmente, uma vez que no continente americano o país foi o último a abolir a escravidão. Essa questão, porém, é apenas secundária, e o processo de abolição só foi possível por conta da luta dos escravos.
A abolição do trabalho escravo é um assunto que atravessou a história do nosso país e do mundo ao longo do século XIX. Uma questão que estava diretamente ligada com a abolição da escravidão era a proibição do tráfico negreiro. No caso do nosso país, esse era um assunto em evidência, antes mesmo da independência.
Já no período joanino, havia negociações entre Portugal e Reino Unido para que o tráfico negreiro fosse abolido em definitivo. Essas negociações estenderam-se depois que o Brasil conquistou sua independência, e o reconhecimento do Brasil, enquanto nação, só aconteceu por meio de um compromisso assumido por nosso país de que o tráfico ultramarino seria proibido, em 1830.
A partir desse compromisso, saiu uma lei, em 1831, que proibia o tráfico, mas as autoridades brasileiras faziam vistas grossas e, apesar da proibição, os cativos africanos continuaram a chegar ao Brasil em grande quantidade. O historiador Carlos Eduardo Moreira Araújo aponta que, entre 1831 e 1845, cerca de 470 mil africanos chegaram ao Brasil por meio do tráfico ultramarino|1|.
A negligência das autoridades brasileiras em não reprimir o tráfico negreiro fez a Inglaterra tomar uma medida radical chamada Bill Aberdeen, que colocava em jogo a soberania das águas brasileiras, e que quase levou Inglaterra e Brasil à guerra. Para evitar um maior desastre, os políticos brasileiros optaram por aprovar uma nova lei proibindo (novamente) o tráfico negreiro no Brasil. Essa foi a Lei Eusébio de Queirós, implantada no país, no ano de 1850.
Essa lei teve aplicabilidade imediata e foi acompanhada de uma grande repressão governamental que fez com que o tráfico negreiro se enfraquecesse e deixasse de existir rapidamente. Com a proibição do tráfico ultramarino, foi intensificado, no Brasil, o tráfico interprovincial, isto é, a venda de escravos realizada internamente, entre províncias.
O caminho para a abolição ainda foi muito longo e foram necessários 38 anos para que a escravidão dos negros fosse abolida em nosso país. Nesse período, a resistência dos grandes proprietários escravocratas foi intensa no meio político, o que fez com que o nosso processo de abolição da escravatura acontecesse de maneira muito gradual.
O movimento abolicionista, por sua vez, só ganhou força a partir da década de 1870, e o fortalecimento do abolicionismo fez com que algumas leis fossem aprovadas no Parlamento brasileiro: a Lei do Ventre Livre e Lei dos Sexagenários. Veja o que cada uma dessas leis determinou:
Lei do Ventre Livre (1871): determinava que todo filho de escravo nascido após 1871 seria considerado livre, cabendo ao dono do escravo dar sua liberdade com oito anos de idade (recebendo indenização), ou aos 21 anos de idade (sem receber indenização).
Lei dos Sexagenários (1885): concedia alforria aos escravos que possuíssem idade superior a 60 anos. Os escravos alforriados ficavam obrigados por lei a prestar “serviços indenizatórios” durante três anos.
Ambas as leis atendiam demandas importantes para os escravocratas: a demanda por indenização dos cativos (seja por meio de trabalho compulsório, seja por meio de um valor específico) que garantiam sua liberdade e o enfraquecimento temporário dos movimentos abolicionistas. A Lei dos Sexagenários, por exemplo, foi encarada pelos abolicionistas da época como uma verdadeira derrota para a causa.
A década de 1880 foi um momento de grande agitação política e a abolição do trabalho escravo foi a pauta que agitou a sociedade brasileira. O movimento abolicionista tinha ganhado uma força muito grande e a causa foi abraçada por inúmeros grupos de nossa sociedade. As associações abolicionistas espalhavam-se pelo país e atuavam em diversas frentes: legais e ilegais (à luz da legislação da época).
Um grupo notável de pessoas como Luís Gama, José do Patrocínio, André Rebouças, Aristides Lobo, Manuel Quirino, entre outros, atuava firmemente na defesa da causa abolicionista. A mobilização de parte da sociedade na defesa da abolição ocorreu de diversas formas, e os escravos eram muitas vezes incentivados a se rebelar, eram abrigados por pessoas quando fugiam e defendidos nos tribunais por advogados.
Houve casos de delegacias e portos que foram atacados por pessoas comuns, pois aprisionavam escravos fugidos para devolvê-los a seus donos. Essas pessoas que atacavam esses locais resgatavam os escravos e os libertavam. Além disso, a propaganda pelo abolicionismo ocupou espaços importantes, e intelectuais, gozando de sua posição, faziam anúncios em jornais defendendo a causa.
A adesão ao abolicionismo e a propaganda da causa espalharam-se de tal forma pela sociedade brasileira que, nos grandes centros do país, a camélia branca tornou-se um símbolo de adesão ao abolicionismo. As pessoas que cultivavam a flor em sua casa ou portavam um broche de camélia branca em sua roupa anunciava publicamente seu apoio ao abolicionismo.
A abolição da escravatura, porém, não aconteceu somente por meio da luta realizada pela parcela não escravizada de nosso país. A resistência dos escravos foi fundamental, pois, como pontua o historiador João José Reis, impôs limite aos horrores cometidos por seus opressores|2|. Os escravos revoltavam-se de diversas maneiras.
A forma mais comum de resistência dos escravos era as fugas e, na década de 1880, surgiram vários quilombos que abrigavam os escravos fugidos. As cidades do Rio de Janeiro e de Santos ficaram notabilizadas pela grande quantidade de quilombos que surgiram nos seus arredores. Esses quilombos eram usados para organizar rotas de fuga, abrigar outros escravos e organizar outras formas de resistência.
Houve casos em que os escravos rebelados tomavam o controle da propriedade na qual eram escravizados e matavam seus senhores. Em muitos locais, os escravos organizavam-se para se rebelar nos “dias santos”, isto é, dias de festas religiosas ou de missas. Tudo isso reforça uma visão trazida pelos historiadores de que os escravos foram agentes ativos na luta pela emancipação.
Assim, dentro desse contexto, a ação do Estado em manter a escravidão tornou-se ineficaz. O sinônimo do enfraquecimento da escravidão no Brasil foi as ações tomadas no Amazonas e no Ceará, em 1884. Esses dois estados decretaram a abolição da escravatura em seus territórios.
A defesa do abolicionismo havia ganhado força na sociedade brasileira e, além disso, a resistência dos escravos africanos tornou a manutenção da escravidão impossível, porque as revoltas e fugas eram tão frequentes que colocavam em “risco” a ordem interna do país. Assim, a mobilização dos escravos e dos grupos abolicionistas forçou o Império a abolir com a escravidão, em 1888.
Nesse contexto, foi levado para o Senado o projeto que defendia a extinção imediata e sem indenização da escravidão no Brasil. Esse projeto foi proposto por João Alfredo, político do Partido Conservador. A lei foi aprovada no Senado e, no dia 13 de maio de 1888, foi levada para a princesa Isabel para que ela assinasse, colocando-a em vigor.
A princesa regente do Brasil assinou a Lei Áurea no dia mencionado, e a capital do Brasil – na época o Rio de Janeiro – entrou em festa. Os relatos resgatados pelos historiadores contam que milhares de pessoas reuniram-se nas ruas do Rio de Janeiro e as comemorações pela abolição estenderam-se na capital durante dias.