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A prisão de Monteiro Lobato

Em 20 de março de 1941, há 80 anos, Monteiro Lobato foi preso preventivamente, acusado de crime contra a segurança do Estado e a ordem social, por supostamente injuriar os poderes públicos e os agentes públicos. Considerado um dos maiores autores de histórias infantis, sua obra mais conhecida é O Sítio do Picapau Amarelo, composta de 23 volumes.

Nascido na cidade de Taubaté, Província de São Paulo, em 18 de abril de 1882, em uma família abastada, foi um foi relevante escritor, ativista político, diretor e produtor brasileiro. Desde muito novo demonstrava vocação para escrita, tendo contribuído com inúmeros jornais e entre outras publicações por praticamente toda vida.

Teve sua formação como bacharel em direito pela Faculdade de Direito de São Paulo, no Largo de São Francisco. Logo após formar-se, regressou a Taubaté, onde passou a ocupar interinamente a promotoria local. Embora tenha trabalhado a vida toda com jornais, inclusive de grande porte, sua fama iniciou-se em 1914 com o artigo intitulado Velha Praga, publicado no jornal O Estado de S. Paulo. O artigo foi bastante polêmico, com críticos como o folclorista Cornélio Pires e apoiadores como Rui Barbosa.

Em 24 de maio de 1940, em plena Ditadura do Estado Novo, Monteiro Lobato escreveu uma carta ao presidente Getúlio Vargas, seguida de outra ao general Góes Monteiro, chefe do Estado-Maior do Exército, ambas fustigando a “displicência do sr. Presidente da República, em face da questão do petróleo no Brasil, permitindo que o Conselho Nacional do Petróleo retarde a criação da grande indústria petroleira em nosso país, para servir, única e exclusivamente, os interesses do truste Standard-Royal Dutch”.

As cartas eram uma clara denúncia da política do Conselho Nacional do Petróleo (CNP) de perseguição sistemática às empresas nacionais, colocando “embaraços legais” à exploração do subsolo. Sendo o tiro de misericórdia nas moribundas companhias nacionais as exigências estabelecidas no Decreto nº 2.179, de 8 de maio de 1940.

Em 17 de dezembro de 1940 o general Júlio C. Horta Barbosa, Presidente do CNP, oficiou ao Presidente do Tribunal de Segurança Nacional, com o seguinte teor: “Por várias vezes se serve o autor da carta (Monteiro Lobato) do seu argumento ‘Qui Prodest?’ (A quem aproveita?), para sustentar que a política do Conselho é conduzida segundo os interesses dos trustes internacionais, pois que só a estes aproveita…

Nessas condições, parece ocorrer o crime previsto no Decreto-Lei nº 431, de 18 de maio de 1938, artigo 3º, nº 25. Se assim entender V.Excia., solicitará as providências legais para apuração da responsabilidade do autor da carta em apreço.”

O Ministro F. de Barros Barreto, Presidente daquela Corte de Exceção, em 6 de janeiro de 1941 solicitou ao Chefe de Polícia de São Paulo a abertura de inquérito. Em 27 de janeiro de 1941 a Superintendência de Segurança Política e Social de São Paulo procedeu a uma busca e apreensão.

O inquérito foi concluído pelo delegado Rui Tavares Monteiro, em 1 de fevereiro de 1941, afirmando que “constituiria, sem dúvida um crime de lesa-pátria, que comprometeria o próprio Governo Federal, de que ele é representante”. No inquérito Lobato, afirmou que “o Conselho não passava dum ingênuo instrumento do imperialismo da Standard”.

Em 18 de março de 1941, o Procurador Gilberto Goulart de Andrade requereu a prisão preventiva, após ter se pronunciado nos autos: “À vista do exposto, é de concluir-se que José Bento Monteiro Lobato está incurso no artigo 3º, inciso 25 do Decreto-lei nº 431, de 18 de maio de 1938, sujeito à pena de seis meses a dois anos de prisão”. Dois dias depois, em 20 de março, Monteiro Lobato foi preso na Casa de Detenção de São Paulo.

Os advogados de defesa de Monteiro Lobato demonstraram as enormes contribuições de Lobato ao País, bem como a não incidência do crime de injúria, visto que o teor das cartas não foi divulgado. Em 8 de abril de 1941, o Cel. Augusto Maynard Gomes, Juiz do Tribunal de Segurança Nacional, proferiu a sentença absolutória.

Entretanto o Tribunal Pleno, onde a acusação recorreu reformulou a sentença: “para condenar José Bento Monteiro Lobato à pena de seis meses de prisão, grau mínimo do artigo 3º, inciso 25, do Decreto-lei nº 431, de 1938, reconhecida, na ausência de agravantes, a ocorrência da circunstância atenuante de exemplar comportamento anterior”.

Monteiro Lobato foi libertado apenas em 20 de junho de 1941, após indulto em 17 de junho de 1941 do Presidente da República, perdoando-lhe o restante da pena imposta.