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Prerrogativas da advocacia: a arma da cidadania

O artigo “Prerrogativas da advocacia: a arma da cidadania”é de autoria do advogado Henri Clay Andrade, ex-presidente da OAB de Sergipe. Foram três mandatos exercidos por Henri Clay, nascido em Lagarto (SE), sempre por meio do voto direto da advocacia sergipana:

“Depois de 21 anos de ditadura militar no Brasil, a constituição federal restabeleceu a ordem jurídica democrática, promoveu novos valores sociais e criou um sistema de proteção e garantias fundamentais para todos os cidadãos brasileiros.

As liberdades públicas, as igualdades, a segurança jurídica, a dignidade da pessoa humana e a justiça social são expressões dos valores supremos da República Federativa do Brasil, comprometida com uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.

A constituição federal brasileira declara que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou até mesmo diretamente, através de plebiscito, refendo ou lei de iniciativa popular. É a forma de governo do povo, para o povo, pelo povo, já dizia o estadista e ex-presidente dos EUA Abraão Lincoln.

A democracia é uma criação filosófica e jurídica que visa a se contrapor à aristocracia e a qualquer concepção autoritária de poder. Uma sociedade estruturalmente excludente, racista, machista, misógina, preconceituosa, é inconciliável com os valores e com os princípios democráticos.

A democracia é um processo histórico de maturação, que passa pela transformação de consciência das pessoas. Segundo o jurista alemão Hans Kelsen, a democracia é sobretudo um caminho: o da progressão para a liberdade.

Os messiânicos, justiceiros, xerifes, coronéis políticos, milicianos são personagens fundados em uma sociedade autoritária, violenta, excludente, preconceituosa, patrimonialista e intolerante na qual prevalece o mandonismo do poder econômico e político.

A constituição federal, ao proclamar o imperativo da legalidade, anunciou a ruptura com essa estrutura autoritária, desigual e preconceituosa, abrindo as portas para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, cujo objetivo central é promover o desenvolvimento nacional sustentável, pautado na erradicação da pobreza e na redução progressiva das desigualdades sociais e regionais.

Uma nação verdadeiramente democrática pressupõe o império das leis, a prevalência das instituições, o bem-estar social e as garantias das liberdades e da igualdade de oportunidades, sem distinção de qualquer natureza.

Em um Estado democrático, sempre que necessário, os direitos das pessoas devem ser protegidos pelo Poder Judiciário. Isso se dá através de um processo judicial transparente, dialético, democrático e justo, que garanta a ampla defesa aos cidadãos e à coisa julgada imantada no direito, na valoração racional das provas e na imparcialidade do juízo.

A ampla defesa é muito mais do que um direito individual. É pressuposto da democracia. É a garantia de proteção contra o arbítrio, contra a submissão à tortura e ao tratamento desumano ou degradante. É o compromisso da democracia de que ninguém será obrigado ou ameaçado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Não há democracia sem o absoluto respeito à ampla defesa. Violar esse direito e garantia fundamental é fraudar a lei e corromper o sistema de justiça.

A constituição federal concebeu a advocacia como indispensável à administração da justiça. O exercício pleno da advocacia é essencial para o Estado democrático cumprir o seu desiderato de promover igualdade, liberdade e justiça social.

É fundamental que a advocacia seja desempenhada com plena liberdade e independência na defesa dos direitos dos cidadãos. Para tanto, a constituição federal, no artigo 133, assegura a inviolabilidade dos atos e manifestações no exercício da profissão.

Não é à toa que a lei federal nº 8.906/94, em seu artigo 6º, declara, expressamente, não existir hierarquia funcional entre advogados, juízes e membros do Ministério Público. Todos devem respeito mútuo. Cada um no seu quadrado, desempenha função pública de alta relevância social.

Essa mesma lei, no artigo 7º, também elenca, minuciosamente, as prerrogativas da advocacia como instrumento indeclinável à garantia fundamental da ampla defesa dos cidadãos.

Para o ingresso nos quadros da OAB e para aquisição da habilitação ao exercício da advocacia, não basta a aprovação no exame de Ordem. É preciso, sobretudo, que as advogadas e os advogados tenham conduta moral e ética compatíveis com a profissão, e que prestem solenemente o compromisso público de exercê-la em defesa da constituição, da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos e da justiça social.

Os advogados e as advogadas não têm privilégios pessoais. As prerrogativas são conferidas ao pleno exercício da advocacia para garantir os direitos fundamentais dos cidadãos à ampla defesa e à prestação jurisdicional justa.

As prerrogativas da advocacia são a arma da cidadania contra a corrupção e o abuso de poder. A sua violação é um grave atentado à democracia e aos princípios republicanos.

Respeitar e defender as prerrogativas da advocacia é republicano e democrático. É valorizar e enaltecer a cidadania. Portanto, sem advocacia plena, não há democracia verdadeira e nem justiça para valer”.