Completa hoje (23/07) 29 anos o massacre – que ficou conhecido como a Chacina da Candelária – que marcou as escadarias da Igreja da Candelária, no centro do Rio de Janeiro, com o assassinato de 8 crianças e adolescentes moradores de rua. As mortes ocorreram durante uma ação policial, no dia 23 de julho de 1993, quando cerca de 70 crianças e adolescentes que dormiam nas proximidades do templo foram alvejadas por policiais civis e militares. Quatro PMs chegaram a ser presos, mas cumpriram apenas parte da pena.
Os meninos, frutos de lares desestruturados, muitas vezes precisavam roubar para comer e, algumas delas se envolviam até mesmo com o tráfico de drogas. Andando sempre em grupo, as vítimas permaneciam juntas também durante a noite. No momento da chacina alguns morreram dormindo, outros enquanto corriam tentando fugir, e ainda, dois corpos foram encontrados executados em uma área abandonada próximo ao Museu de Arte Moderna, no Aterro do Flamengo.
Um dos presentes na hora do massacre era Wagner dos Santos. Ele foi a principal testemunha do caso, peça fundamental na procura pelos culpados. Wagner, contou que enquanto fugia do local com outros dois meninos, um carro parou ao seu lado e o obrigou a entrar no veículo. Os criminosos, então, efetuaram quatro tiros contra ele, que sobreviveu — os outros dois amigos morreram.
No hospital, o jovem descreveu os homens que o sequestraram, levando a polícia a identificar os primeiros suspeitos. Em setembro de 1994, Wagner foi vítima de um segundo atentado, desta vez na Estação Central do Brasil, onde foi atingido por quatro tiros. As autoridades colocaram-no no Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas. Hoje ele vive na Suíça, sob a proteção do governo.
A investigação, guiada pelo retrato falado oferecido pelo sobrevivente, identificou sete policias militares como suspeitos. No entanto, três deles foram inocentados, um deles foi morto durante o processo — possivelmente por queima de arquivo — e, outros três foram acusados e considerados culpados, são eles: Nelson Oliveira dos Santos Cunha, Marcus Vinícius Emmanuel Borges e Marco Aurélio Dias de Alcântara. Apesar de terem recebido uma sentença que variava de 20 até 300 anos de prisão, todos os três foram soltos antes que completassem o período mínimo.
O motivo da chacina é visto como resolvido para a Justiça brasileira. No dia anterior ao massacre, os policiais efetuaram uma prisão de dois meninos, os amigos jogaram pedras na direção dos oficiais, sendo que uma delas quebrou o vidro da patrulha do 5º BPM. As mortes seriam uma vingança pelo ocorrido.
A voluntária Yvonne Bezerra de Mello conseguiu, com conhecidos, quatro barracos no Morro da Cachoeirinha, para onde levou cerca de quarenta sobreviventes que estavam desamparados pelo poder público, onde ficaram por alguns meses após o ataque. Embaixo do viaduto, Yvonne começou o Projeto Coqueirinho, uma sala de aula com tapumes, para educar essas crianças com uma metodologia criada por ela. Anos depois, a escola se tornou o Projeto Uerê, na Maré, escola modelo no atendimento de crianças traumatizadas pela violência.
Yvonne, que era uma importante testemunha do caso, também foi sequestrada após a chacina. Por cerca de cinco horas homens a mantiveram amarrada, encapuzada e com um fuzil apontado para a sua cabeça e então a deixaram no subúrbio do Rio. Yvonne, em 2001, estimou que 39 das 72 crianças que dormiam na Candelária na época do massacre morreram de causas violentas nas ruas. Em 2018, ela afirmou em entrevista que acreditava que quase todos os sobreviventes da chacina havia morrido. O último que ela mantinha contato foi morto por uma bala perdida na Maré. Em 2001, ela estimou que 39 das 72 crianças que dormiam na Candelária na época do massacre morreram de causas violentas nas ruas. Em 2018, ela afirmou em entrevista que acreditava que quase todos os sobreviventes da chacina havia morrido. O último que ela mantinha contato foi morto por uma bala perdida na Maré
Um dos sobreviventes do massacre voltou a estampar as manchetes em mais uma tragédia que parou o país, no caso conhecido como o sequestro do ônibus 174. Em 12 de junho de 2000, Sandro Barbosa do Nascimento, de 21 anos, fez dez reféns em um ônibus por cerca de quatro horas. Cercado por policiais e pela imprensa, que televisionou todo o sequestro, ele gritava pedindo que chamassem a “Tia Yvonne”, mas ela não ficou sabendo. Ao tentar descer do ônibus com uma refém, um policial errou a mira e a acertou. Sandro reagiu e também atirou na refém Geísa Gonçalves, que morreu, após ser levado pela polícia militar, ele foi morto asfixiado dentro do camburão. Além de ter testemunhado, quando criança a morte de seus “irmãos” da candelária, Sandro também já havia testemunhado, aos dez anos, o assassinato de sua mãe – crime que fez com que ele fosse parar nas ruas.
Em setembro de 2000, Elizabeth Cristina de Oliveira Maia, conhecida como Beth Gorda, que também testemunhou o massacre, foi assassinada com três tiros na cabeça, por três homens, na porta de sua casa, em Botafogo. Ela participou de um documentário sobre a chacina e iria depor no mês seguinte ao seu assassinato em uma audiência de apelação de Emanuel.