A Justiça Federal do Rio Grande do Norte escreveu mais um importante capítulo na história do Judiciário brasileiro. A Seção potiguar foi a primeira do país a conceder a um cidadão não nacional os direitos decorrentes da condição de apátrida (pessoa cuja cidadania não é reconhecida por nenhum país). A decisão determinou ainda que o Governo brasileiro oferecesse documento de identificação e autorizou o exercício de um trabalho. Esse caso, que teve sua primeira decisão judicial em 2010, proferida pelo então Juiz Federal Edilson Pereira Nobre Júnior, hoje Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, teve o seu desfecho final, com o processo transitando em julgado, ou seja, sem possibilidade de recurso, após análise pelo Supremo Tribunal Federal.
Essa história escrita pela JFRN junto com Andrimana Buyoya Habizimana será destaque em seminário que marca a abertura do ano letivo do curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, que acontecerá na próxima segunda-feira, a partir das 8h30.
Estarão no evento os principais personagens da história: o Desembargador Federal Edilson Nobre, que foi autor da primeira decisão, o professor Marcos Guerra, advogado do apátrida na época, e o cidadão beneficiado, Andrimana Buyoya Habizimana, que continua morando em Natal. Além deles, estudiosos do tema da apatridia também participarão do debate.
Andrimana Buyoya Habizimana hoje trabalha na Liga Norte-Rio-Grandense contra o Câncer, na capital potiguar. A história dele no Brasil começa em 2006 e, para conseguir os direitos de cidadania não foi fácil. Primeiro foi feita uma tentativa como refugiado, mas o Ministério da Justiça não concedeu. Assim como o visto de imigrante permanente.
A última esperança foi a Justiça e foi com ela que ele conseguiu a sonhada cidadania. Ao determinar que União absorva o africano como cidadão, o juiz federal apontou que o migrante está integrado às atividades da comunidade.
Em 2006, o africano Andrimana Buyoya Habizimana embarcou em um navio cargueiro da África do Sul com destino ao porto de Santos (SP). No mesmo ano, ele tentou entrar em Portugal, em um voo partindo de Natal. No entanto, ao chegar lá foi detido e encaminhado ao Brasil pela imigração portuguesa. Ao chegar aqui ele foi condenado pela justiça brasileira e cumpriu pena até 2008.
O país africano de sua origem, o Burundi, vivencia crise política e econômica, com diversas disputas étnicas e, por isso, após cumprir pena no Brasil, Andrimana solicitou ao Conselho Nacional para Refugiados (Conare) e ao Conselho Nacional de Imigração refúgio e visto permanente de imigrante, respectivamente, mas foram negados.
Em diligências feitas pela Polícia Federal, foi constatado que as Embaixadas de Burundi e da África do Sul não asseguram cidadania e não aceitam a deportação. Por isso, restou ao africano, representado por uma equipe de professores e estudantes de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, recorrer à Justiça.